A polémica Lensa - qual o limite da Inteligência Artificial?

Nos últimos anos, temos assistido a uma introdução de várias tecnologias de inteligência artificial que, através dos seus algoritmos, automatizam várias tarefas do nosso quotidiano, desde assistentes virtuais a reservas online, entre outros. Porém, estamos a entrar numa outra fase desta introdução, em que estes mecanismos estão a evoluir de meros assistentes das nossas tarefas para criadores de conteúdo artístico.

 

Se és um utilizador ativo das redes sociais, especialmente no Instagram, terás certamente reparado numa grande partilha de retratos personalizados, nos mais variados estilos artísticos. Estes retratos, por muito que pareçam ter sido feitos por artistas diferentes, são criados por uma só aplicação e apenas em alguns minutos – a Lensa, que utiliza a inteligência artificial para a criação de ilustrações e que está a gerar uma grande polémica na comunidade artística.

Lensa

No que consiste a aplicação Lensa?

Vamos começar por entender melhor esta app. A Lensa, fundada em 2018, pela empresa Prisma Labs, começou por ser uma aplicação de edição de fotos, com funcionalidades muito semelhantes a grande parte das outras aplicações deste género. No entanto, foi em novembro deste ano, que lançou uma nova funcionalidade com base na inteligência artificial – Magic Avatars. 

 

Foi com este lançamento que começou a ter uma maior aderência e a viralizar nas redes sociais, conseguindo, só nos primeiros 12 dias de dezembro, cerca de 13.5 milhões de downloads a nível mundial. Estima-se ainda que, nesse mesmo período, houve um investimento por parte dos utilizadores de 29.3 milhões de dólares nesse serviço.

 

A adesão foi tão grande que rapidamente se tornou na aplicação mais descarregada da App Store, na categoria de fotografia e vídeos.

Como funciona a vertente Magic Avatars da aplicação Lensa?

Como já mencionado, a Lensa tem também a sua vertente inicial de edição de fotos. Então, ao descarregarmos a aplicação, são apresentadas duas opções: para de comprarmos apenas as suas funcionalidades-base ou a de utilizarmos a funcionalidade de inteligência artificial  “Magic Avatars”.

 

Os packs da funcionalidade de inteligência artificial, são comercializados entre $3.99 e $49.99, sendo que a primeira opção dá a possibilidade de gerar 50 imagens diferentes.

 

Para a funcionalidade Magic Avatars, a aplicação pede ao utilizador que carregue entre 10 a 20 imagens, de cada pessoa, para que o resultado das imagens seja o mais realista possível. Assim, quantas mais imagens forem submetidas, melhor o resultado produzido pelo algoritmo de inteligência artificial.

 

Esta funcionalidade é possível, através da integração de uma rede de código aberto – Stable Diffusion, um modelo capaz de gerar imagens realistas a partir de qualquer texto, através de inteligência artificial.

 

 

Para entenderes melhor a lógica por detrás deste tipo de ferramentas, podes ler o nosso artigo: Inteligência Artificial vs designers: o futuro do design gráfico

Quais as controvérsias em torno da Lensa e da utilização de inteligência artificial?

Uma vez que agora compreendemos melhor como funciona a inteligência artificial da aplicação Lensa, podemos começar a entender de que forma esta tem estado a gerar algumas opiniões e experiências menos positivas.

 

Certamente, até tu já terás algumas opiniões formadas em relação a este tópico!

 

Assim, vamos analisar os três tópicos que têm gerado mais discussão e trazido mais descontentamento, tanto aos utilizadores, como aos não utilizadores:

1 – A falta de controlo sobre as imagens criadas pela aplicação

 

Um dos motivos que tem dado origem a feedbacks menos positivos por parte dos utilizadores e que está a gerar opiniões negativas em relação a esta aplicação, é o pouco controlo sobre as imagens que o utilizador tem a partir do momento em que a submete na aplicação. Pois ao fazê-lo, dá margem a que surja qualquer imagem, mesmo que seja fictícia.

Isto leva as pessoas a ter experiências menos positivas, em que a aplicação, por defeito, cria imagens sexualmente sugestivas, sem a autorização do utilizador e, por vezes, com imagens de crianças, embora a aplicação não recomende o uso desta funcionalidade a menores.

 

Além disso, neste tópico,  entra, também, a possibilidade de os utilizadores submeterem fotos de outras pessoas criando imagens sem o consentimento das mesmas e, mais uma vez, sem controlo do resultado e do seu uso.

2 – A utilização do trabalho de outros artistas para a criação destas imagens

 

Além das opiniões dos utilizadores, também a comunidade artística tem-se manifestado ativamente nas redes sociais, contra esta app.

Um dos motivos para tal, é o facto de o trabalho de muitos artistas estar a ser “copiado” pelo software.

 

E de que forma é que é “copiado”? 

 

Como mencionado anteriormente, a base utilizada pela Lensa para criar estas imagens é o reconhecimento de texto.

Por exemplo, se pedirmos que uma certa imagem seja recriada no estilo “ilustração de aguarela”, o software de inteligência artificial analisa um conjunto de imagens que reconhece como deste estilo e replica a original com base nas mesmas.

 

Então, o que acontece é que essas imagens que servem de exemplo para o software, são imagens de artistas reais, que não deram nenhuma autorização para que o seu trabalho fosse utilizado para este fim. 

 

Os utilizadores têm reportado que, em algumas imagens geradas pela Lensa, consegue-se ver vestígios dos artistas originais como é possível observar abaixo.

3 –  A substituição dos artistas no mercado

 

Outro motivo de preocupação para a comunidade artística é, ainda, a ameaça da sua substituição no mercado por softwares e aplicações de inteligência artificial, como esta. Pois, para o cliente sairá mais em conta obter 50 ilustrações, numa questão de minutos e por um valor mais baixo, do que recorrer a um artista que não tem capacidade de o conseguir concretizar, nem num tempo, nem num valor tão reduzido.

 

Em relação a este tópico, a marca fundadora desta aplicação, Prisma Labs, já partilhou a sua opinião e defendeu, tanto a Lensa, como outras aplicações que utilizam a inteligência artificial para criação de conteúdo artístico. Dando o exemplo de que, assim como o cinema não veio substituir o teatro, estes softwares não são desenvolvidos com o objetivo de substituir os artistas, mas sim de ajudá-los, facilitando e tornando o seu trabalho mais acessível.

A Lensa é apenas um exemplo de uma aplicação que está a integrar a inteligência artificial na arte e estes são apenas alguns dos tópicos que têm gerado mais discussão nas redes sociais.

 

Independentemente das opiniões positivas ou menos positivas e das vantagens ou desvantagens deste avanço tecnológico, a verdade é que é algo que já não vamos a tempo de conseguir evitar. Porém, podemos influenciar a sua aplicação na sociedade, de modo a cumprir melhor as necessidades do utilizador e respeitar a comunidade artística da melhor forma possível.

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